quarta-feira, 17 de setembro de 2014

O louco





 

Perguntais-me como me tornei louco.
Aconteceu assim:
um dia, muito tempo antes
de muitos deuses terem nascido,
despertei de um sono profundo e notei que todas
as minhas máscaras tinham sido roubadas

- as sete máscaras que eu havia confeccionado
e usado em sete vidas -e corri sem máscara pelas
ruas cheias de gente, gritando:
"Ladrões, ladrões, malditos ladrões!"

Homens e mulheres riram de mim e alguns correram
para casa, com medo de mim.
E quando cheguei à praça
do mercado, um garoto trepado no telhado de uma
casa gritou: "É um louco!".

Olhei para cima, para vê-lo.
O sol beijou pela primeira vez minha face nua.
Pela primeira vez, o sol beijava minha face nua, e
minha alma inflamou-se de amor pelo sol,
e não desejei mais minhas máscaras. E, como num
transe, gritei:

"Benditos, benditos os ladrões
que roubaram minhas máscaras!"
Assim me tornei louco.

E encontrei tanto liberdade como segurança em minha loucura:
 e a segurança de não ser compreendido, pois aquele desigual
que nos compreende escraviza alguma coisa em nós.

 
Khalil Gibran (1883-1931)

 

 

 

Por Aline Andra


 

Um comentário:

  1. Um arrepio foi tomando conta de mim à medida que prosseguia na leitura destes fantásticos versos e, enquanto isso acontecia, o tempo foi passando, os dias, os anos... Ah! Meu tempo de Gibran, Sidarta, O lobo da Estepe, Fernão Capelo Gaivota...
    Muito obrigado por esta maravilhosa viagem que sua postagem me proporcionou, Aline!

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